“Ao que me levaram minhas
pesquisas, um dos primeiros a se levantar contra a ascenção do Evangelho ao
poder no Brasil, foi Paulo Wright, mais conhecido no Paraná e assassinado pelo
Doi-Codi em São Paulo. Seu
irmão, todos conhecem, pastor James Wright, demitido da Igreja Presbiteriana na
época da ditadura militar, que se tornou secretário de dom Paulo Evaristo Arns,
na época arcebispo de São Paulo.
A tentação de unir o poder
divino ao poder temporal político sempre foi grande entre os cristãos, uma
espécie de antecipação do reino de Deus sobre a Terra. Pena que essa louvável
ambição não esteja vacinada contra os desvios que levaram o cristianismo
pós-Justiniano a se tornar mais reino dos homens, antecipando-se também às
penas do inferno, previstas por Deus, aos inimigos políticos, chegando-se à
teocracia da Idade Média e aos diversos tipos de inquisição.
A jovem geração de hoje tem
o privilégio de assistir ao vivo, como num laboratório de ciências exatas, o
que foi a ascenção dos monoteistas cristãos ao poder, durante séculos, na
Europa e colonias, olhando ao que se passa no Magreb e no Oriente Médio depois
da fracassada primavera árabe hoje transformada em primavera islamita,
coordenada pelos mentores de outra crença monoteista.
Em poucas palavras, o
casamento do poder político com o chamado poder espiritual provoca sempre
intolerância, perseguição, condenação das minorias e a submissão se transforma
num dos principais valores na tábua das leis e da moral defendida pelos
supostos delegados de Deus.
O citado Paulo Wright pagou
com a vida não ter aceitado compactuar com um dos primeiros desvios
político-religiosos do protestantismo brasileiro, cuja bandeira até o golpe de
64 tinha sido (talvez por ser minoria) a da laicidade. Quando os presbiterianos
de Boanerges Ribeiro decidiram apoiar o golpe militar contra a “ameaça
comunista” de Goulart, sendo seguidos por batistas e metodistas, foi
ultrapassado o limite que poderia manter, no futuro (os dias que hoje vivemos),
a separação entre Igreja e o Estado.
Apesar de binacional,
americano-brasileiro, Paulo Wright divergiu e apostatou, como já estava no
fichário do FBI por deserção, foi sacrificado em nome de uma futura
evangelização brasileira, com suas escolas e universidades ensinando o
criacionismo e o conformismo, antidotos seguros contra o pensamento livre. Inoculados
na tenra idade, esses princípios são a garantia de populações pacíficas
respeitadoras das multinacionais, do capitalismo no molho calvinista e do
conformismo filantrópico diante da miséria.
Mas os presbiterianos,
batistas, metodistas, luteranos nunca conseguiram ser populares, sempre foram
assimilados a uma elite religiosa vinda da Europa e dos EUA e não conseguiam
penetrar no legado católico trazido pelos portugueses, do qual derivou-se um
sincretismo de crendices e um comportamento determinista. Poderia ser uma
solução para um confortável imobilismo social não ameaçador, porém, o
catolicismo, com sua estrutura de potentado conservador, não era herméticamente
fechado. O vazamento mais importante tinha sido o da teologia da libertação e
os padres dominicanos com seu Brasil Urgente apoiavam as reformas de base dos
anos 60.
Era preciso algo diferente –
que tolerasse e suportasse a desigualdade social e que transportasse para o
além os idéias de justiça social, transformados numa futura justiça divina. Um
analgésico capaz de acalmar as dores vindas de injustiças e explorações,
conjugado com eficientes anestésicos. Alguma coisa sutil, capas de distribuir a
leitura, dando a impressão de instrução popular, mas privilegiando um único
livro de lendas, como vindo de Deus, em detrimento de todos os outros livros.
Encontrada a fórmula
minimalista desse evangelho de consumo popular, dádiva de Deus açucarada ao
alcance de qualquer um, onde cada pastor é como um imã ou molá islamita, sem
ter de prestar contas a ninguém, sem necessidade de uma preparação maior, o
Brasil foi alvo de enxurradas de dólares para a compra de rádios e teves
prepagadoras do reino de Deus. Excelente o resultado, hoje o Brasil segue rumo
a um país teocrático evangélico.
Mas não é bom se ter um país
temente a Deus ? O temor não é nenhum código de conduta a se seguir. O temor é
sinônimo de intolerância, de perseguição, de recuo, de aniquilamento e rima com
humilhação e subserviência. O homem se colocou de pé depois de milhões de anos
de evolução, que não sejam religiões que o façam ficar de joelhos ou de se
prostrar no chão. Deus quer homens servis ?
A presidenta Dilma quase não
foi eleita por ter falado demais e defendido, como mulher, a legalização do
aborto. Evangélicos, que dizem defender a vida mas que impedem o
desenvolvimento livre do pensamento humano, mais outros religiosos, forçaram a
então candidata a se desdizer e a prometer que no seu governo não haveria
legalização do aborto. Tanto faz se milhares de mulheres ainda morrem por
tentativas de aborto clandestino.
Agora é a Comissão dos
Direitos Humanos e Minorias presidida por um pastor evangélico que, fiel ao
livro santo, é contra homossexuais e que, baseado numa deturpação da lenda
original bíblica, acredita serem os negros, descendentes de Cam, amaldiçoados
pelo pai Noé depois de uma bebedeira.
Para que serve uma Comissão
de Direitos Humanos regida pela intolerância e ignorância ?
Na verdade, estamos também colhendo hoje os
frutos da ditadura militar que aniquilou, em vinte anos, toda o pensamento
livre brasileiro, seus intelectuais nas univerdades, substituídos por pessoas
mal preparadas ou simplesmente sem formação. Está na hora de nos revoltarmos
contra o loteamento do céu por corretores inescrupulosos, que vendem títulos de
propriedade e apólices de bolhas de sabão.”
Mgazine Brasil
Rui
Martins, Direto da Redação
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