HIP 102152 tem 8,2 bilhões de anos e fica a 250 anos-luz da Terra.
Estudo foi feito em parceria com o Observatório Europeu do Sul (ESO).
Uma equipe de quatro astrônomos da Universidade de São Paulo (USP), em
parceria com o Observatório Europeu do Sul (ESO), ajudou a descobrir a
estrela "gêmea" do Sol mais velha já identificada, com 8,2 bilhões de
anos – quase o dobro da idade da nossa estrela, que tem 4,6 bilhões de
anos.
A Hipparcos 102152 (ou HIP 102152) fica a 250 anos-luz de distância da
Terra, na constelação de Capricórnio. Para observá-la, foi usado o Very
Large Telescope (VLT) do ESO, localizado no norte do Chile, durante 40
noites desde 2011. Além da USP, participaram do trabalho dois cientistas
da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e dez
estrangeiros.
Segundo os pesquisadores, que devem publicar os resultados na revista
"Astrophysical Journal Letters", esse astro antigo – que tem
temperatura, gravidade e composição química parecidas com as do Sol –
oferece a possibilidade de entender como o nosso astro vai envelhecer
nos próximos bilhões de anos. Os cientistas confirmaram ainda a idade de
outra estrela "gêmea", a 18 Scorpii, que tem 2,9 bilhões de anos, ou
seja, bem mais jovem que a nossa.
De acordo com a equipe da USP, as observações sugerem que a HIP 102152
também tem planetas rochosos (como Mercúrio, Vênus, Terra e Marte) em
sua órbita. Além disso, a descoberta apontou níveis muito baixos de
lítio na estrela "gêmea", assim como acontece com o Sol, o que demonstra
pela primeira vez que astros mais velhos e semelhantes ao nosso perdem
esse elemento químico ao longo da vida. Esse "mistério" para a
astrofísica já durava 60 anos, e agora começa a ser solucionado,
ressaltam os autores, liderados pela americana TalaWanda Monroe, ligada à
USP.
Para o pesquisador peruano Jorge Meléndez, que também atua na USP e é
coautor do estudo, há décadas os astrônomos buscam estrelas "gêmeas" do
Sol, para conhecer melhor a nossa própria, que é responsável pela vida
na Terra. Apesar disso, a primeira delas só foi encontrada em 1997 e,
desde então, poucas foram identificadas.
Meléndez diz que o objetivo agora, até 2015, é detectar astros ainda
mais velhos, e também mais novos, para entender bem a dinâmica de
envelhecimento solar. Outra meta é identificar "superterras", com massa
entre cinco e dez vezes maiores que a nossa.
A importância do lítio
O lítio é o terceiro elemento da tabela periódica e foi criado durante o Big Bang, ao mesmo tempo que o hidrogênio e o hélio. Há anos, os astrônomos observam que algumas estrelas têm menos lítio que outras. Com a descoberta da HIP 102152, os cientistas viram uma forte relação entre a idade de uma estrela do tipo solar e seu conteúdo de lítio.
O Sol tem hoje apenas 1% da quantidade desse elemento presente na época
de sua formação. Segundo o astrofísico boliviano naturalizado suíço
Ramiro de la Reza, do Observatório Nacional, no Rio de Janeiro, é raro
encontrar uma estrela com tão pouco lítio como o Sol.
"Esse é um elemento leve, muito frágil, que se destrói facilmente por
dois fatores: ou ele queima no interior da estrela, onde é muito quente,
ou se mistura e dilui com o material da superfície (fotosfera) em
contato com o do interior", explica de la Reza, que pesquisa o lítio
desde 1975, quando ajudou a estabelecer a medida exata da abundância
desse componente no Sol, pela Universidade de Genebra, na Suíça.
À medida que uma estrela envelhece, sua temperatura aumenta, e isso
também favorece que o lítio se dissipe. É por isso que esse elemento –
que na Terra é usado em baterias de celulares e medicamentos como
estabilizadores de humor, pra transtorno bipolar – serve como um
indicador de evolução, ou um "termômetro evolutivo", que tem sido um
importante instrumento de pesquisa sobre o Universo.
"O lítio é detectado em lugares mais frios, ou jovens. E também já fiz
uma pesquisa que apontou que o fato de haver exoplanetas (planetas fora
do Sistema Solar) não modifica a quantidade dele, mas esse estudo ainda
precisa ser ampliado", destaca o astrofísico boliviano.
Agora, de la Reza investiga o que acontece com o lítio em estrelas com e
sem disco em volta. Isso porque o disco influencia na rotação do astro,
e a rotação tem impacto direto na quantidade de lítio. O Sol mesmo já
teve um disco em torno de si, que formou os planetas – hoje, o que
sobrou disso são um cinturão de asteroides entre Marte e Júpiter e
partículas mais além de Netuno (chamadas de Cinturão de Kuiper).
"Era um disco de gás que sumiu em 10 milhões de anos, quando o Sol
ainda era uma 'criancinha'. Ele foi embora e só ficou a poeira.
Atualmente, esses asteroides colidem entre si e geram uma nova poeira,
que é de segunda geração", diz.
Sobre a estrela HIP 102152 ser "gêmea" do Sol, de la Reza diz que não concorda com a palavra.
"Não gosto de chamar de gêmeo, sempre tem alguma diferença. Pode ser do
tipo solar, parecida com o Sol, mas nossa estrela é única", destaca.
Adesão do Brasil ao ESO
O ESO é uma organização fundada há 50 anos e formada atualmente por 14 países europeus (Áustria, Bélgica, República Tcheca, Dinamarca, Finlândia, França, Alemanha, Itália, Holanda, Portugal, Espanha, Suécia, Suíça e Reino Unido). Em 2010, o Brasil assinou um acordo de adesão para se tornar o 15° membro, mas a assinatura oficial depende da aprovação do Congresso Nacional, onde o projeto tramita desde fevereiro deste ano.
Ao todo, a proposta deverá passar por quatro comissões da Câmara dos
Deputados e três do Senado. Até o momento, ela foi votada apenas na
primeira comissão da Câmara.
"Essa é a velocidade normal (de tramitação), mas está avançando. Os
políticos precisam entender por que é importante fazer um investimento
desse porte na ciência", diz o diretor científico do ESO, o físico
brasileiro Claudio Melo.
Segundo ele, esses recursos incluiriam uma taxa de adesão de 130
milhões de euros (R$ 404 milhões), divididos em dez anos, além de uma
anuidade proporcional ao Produto Interno Bruto (PIB) do país – o que
hoje giraria em torno de R$ 800 mil e, em 2023, chegaria a R$ 40
milhões.
"Toda essa infraestrutura (do ESO) está disponível à comunidade
brasileira, e a pesquisa (da USP) mostra que temos nível internacional,
como qualquer outro país. Ela é uma maneira de chamar a atenção, não de
pressionar (o Congresso)", afirma Melo.
Sobre a diferença entre usar o complexo do ESO para estudos e se tornar
membro efetivo, a professora Beatriz Barbuy, do Instituto de
Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosférias (IAG) da USP, destaca que
apenas 2% dos pedidos de países não-membros são aprovados para
observação no ESO, o que exige que "o projeto seja tão bom a ponto de
ganhar um Nobel ou tenha como primeiro autor um cientista europeu".
"O ESO tem uma política de 'open sky' (céu aberto), em que qualquer um
pode pedir tempo para observações, mas os membros têm prioridade. E, a
longo prazo, isso muda tudo em termos de política e desenvolvimento
científico e tecnológico para o Brasil", completa Melo.
G1 -BRASIL
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