Um caso exemplar da polícia brasileira: prende-se o suposto
culpado, para depois iniciar-se a investigação, que é sempre a mesma:
porradas primeiro, perguntas depois
O inquérito do assassinato da menina Tayná, no Paraná, ilustra o
tempo de trevas que sobrevive no Brasil. Em breves linhas lembramos
que toda a imprensa noticiou que uma linda jovem de 14 anos, Tayná
Andrade da Silva, havia sido estuprada e morta por quatro empregados
de um parque de diversões, no dia 25 de junho.
E que os frios estupradores confessaram o seu hediondo crime, depois de um rápido e eficiente trabalho da polícia. Os apresentadores na tevê bradavam, elevavam a tensão em nossas veias: “E aí, o que devia ser feito com esses animais?”, e mostravam as imagens das quatro feras.
E que os frios estupradores confessaram o seu hediondo crime, depois de um rápido e eficiente trabalho da polícia. Os apresentadores na tevê bradavam, elevavam a tensão em nossas veias: “E aí, o que devia ser feito com esses animais?”, e mostravam as imagens das quatro feras.
Assim estávamos nós com a nossa consciência insatisfeita, porque
clamávamos pelo sangue desses monstros, quando, passados alguns dias, a
brava perita Jussara Joeckel descobriu que jamais houve qualquer
violência sexual contra Tayná. Mais, que o exame de DNA no sêmen
encontrado na calcinha da jovem não pertence aos tidos como culpados.
E
para o cúmulo do absurdo, a perita afirma que a menina foi morta depois
dos “assassinos” presos. Escândalo. A perita Jussara teve a sorte de ser
apoiada por uma jornalista à altura, Joice Hasselmann. A repórter
divulgou a análise e registrou no Blog da Joice que em meio aos gritos e
ao bate-boca de uma reunião na Secretaria de Segurança, um integrante
da Polícia Civil chegou ao extremo da pergunta: “será que na
contraprova nós não conseguimos um laudo com resultado inconclusivo?”.
Sabe-se agora que o preso Adriano teve um cabo de vassoura enfiado no
ânus, amarrado de ponta-cabeça e agredido com uma máquina de choque,
para que confessasse o crime. A máquina de choque foi usada com uma
haste de metal introduzida no seu ânus. Adriano, internado em hospital,
tem sinais de perfuração no intestino. E todos os presos, depois de
torturados, tiveram que assinara sem ler os “seus” depoimentos escritos.
Infelizmente, este é um caso exemplar da polícia brasileira, de Norte
a Sul do país. Prende-se o culpado, para depois iniciar-se a
investigação que prove a sua culpa. A investigação, todos sabemos, é
sempre a mesma: porradas primeiro, uma pergunta depois.
Se o culpado não
responder logo o que se quer provar, tudo mal. Pau de arara e choques
elétricos como método infalível de apuração. Se responder conforme a
acusação, tudo mais ou menos. A tortura continua, mas dessa vez para
selar o depoimento, ou como gritam os torturadores: “Ah, então você escondia o jogo, não é, safado? Você vai ver agora o que um criminoso merece”. Pelo medo e terror, selam assim a culpa do culpado.
O costume da tortura se transformou em uma coisa tão banal, que os
advogados falam nas entrevistas em invalidação do inquérito, porque
contaminado pela violência. Isso é óbvio. Daí os doutores partem para a
soltura dos presos, com a posterior cobrança ao Estado pela prisão
indevida. O que é justo.
Mas da ação lhes escapa o maior horror: eles
parecem não ver que os policiais deveriam responder, antes de tudo,
pela tortura, porque esse é um crime condenado, imprescritível em nossa
Constituição e em todos os tribunais civilizados. O fundamental lhes
escapa: a mais severa punição prisional para o torturador.
Mais. Chamamos a atenção para o comportamento da imprensa que
reproduz as versões da polícia sem um filtro, sem uma dúvida. Os
repórteres copiam o Boletim de Ocorrência, e de tal modo que repórter
policial é o mesmo que policial repórter. Mas isso é igualzinho ao tempo
da ditadura. É igual àqueles malditos anos em as mortes de
“terroristas” eram reproduções exatas da Agência Segurança Press. Se
não, olhem o que se falou sobre o assassinato da menina de 14 anos nas
tevês:
“Polícia termina investigação sobre morte da menina Tayná”, em Clique aqui 05/07/2013. “Polícia conclui inquérito e afirma que os suspeitos mataram Tayná. em Clique aqui , 05/07/2013
Os exemplos da imprensa brasileira, que reproduz de modo literal o
que a polícia lhe sopra, ao fim de torturante inquérito, poderiam ser
mostrados a um infernal infinito. E o mais grave, leitor. Agora mesmo,
neste preciso instante, um preso comum está sendo torturado, sofrendo
empalação ou é morto. Isso em plena democracia. Era bom que
transformássemos o caso Tayná em um começo de real mudança, nas
delegacias de polícia e na imprensa.
Urariano Mota, Direto da Redação
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